Haiku 73

Os olhos da aranha
penetrantes a furar
meus olhos de medo.

Presa por um fio
Que vai balançando ao vento
A pequena aranha.

De manhã cedinho

Um bordado de orvalho
Na teia da aranha.

Haiku 72

Uma imensa aranha
mergulhada no formol
com olhos vidrados!

Haiku 70

Pelo vidro toco
os pelos da aranha velha
que finge de morta.

Kigô da semana

Aranha

Pergunto ao colibri

Por que está tão apressado

Pra voltar pra casa?

Jovem colibri

Perdido entre os prédios

Da Consolação.

Haiku 69

Por entre as garrafas
postos na encruzilhada
o colibri dança.

Haiku 68

Em vôos rasantes
por sobre o campo sagrado
colibris em festa.

Haiku 67

Sem deter o tempo
colibri sem pressa alguma
põe-se a bater asas.

Kigô da semana

Colibri

Notas sem sentido

Rabiscadas na moldura

De um calendário velho.

Datas com um “X”

Num calendário velho ...

Nem sei mais porque.

Haiku 66

Calendário velho.
As marcações importantes
sem mais importância.

Haiku 65

Calendário velho.
Repetidamente amasso
a massa do pão.

Haiku 64

Calendário velho.
Ao sorrir deixo mostrar
rugas que não havia.

Kigô da semana

calendário velho

A gata assustada

Abandonou seus filhotes

Ao que Deus quiser.

No cesto de vime

Como novelos de lã

Filhotes de gato.

Haiku 63

Filhotes de gato.
O que ninguém quis levar
nasceu sem um olho.

Haiku 62

Por cima dos trilhos
filhotes de gato aquecem-se
ao sol da manhã.

Haiku 61

Filhotes de gato.
Para quem não tem amigos
a tarde mais longa.

Kigô da semana

Filhote de gato

No tronco trincado
Há três filhotes tremendo...
E um trinado triste!

Trinado eufórico:
Rebolando na calçada,
Caminha a morena

Ao ouvir o trinado,
Pulando de cá pra lá,
O gato se agita!

Um trinado agudo
Vindo da janela aberta
Me acorda dos sonhos.

Tarde de sol forte
Sentado no velho banco
Conto borboletas -

Mesa na calçada
A cerveja corre solta
- Borboletas bebem.

A criança corre
Pelo gramado molhado
- Borboletas voam.

Correndo no parque
A coruja buraqueira
Arregala os olhos.

Sopra o vento frio
Na clareira descampada
- A coruja voa!

Embalando as pedras
Os lentos, lentos trinados

De um pássaro só.

 

Trinados e gorjeios

Abafados pelo som

Das motocicletas.

Haiku 60

Os velhos da praça
sem pressa do entardecer.
O trinado fica.

Haiku 59

Em meio à folhagem
trinados sem mostrar a cara.
"Bom dia" respondo.

Haiku 58

Nas folhas molhadas
desta chuva repentina
um débil trinado.

Kigô da semana

Trinado

Sem nenhum destino
borboleta vai pousando
em ombro alheio

Borboleta voa
enquanto o monge discursa
No Grande Vazio

Ao soprar do vento

As borboletas esvoaçam

Silenciosamente.

No farol vermelho

A pequena borboleta

Cruza a Paulista.

Haiku 57

Livro-me de vez
das asas de borboleta.
A tristeza fica.

Haiju 56

Quando acaba o sonho
caçador de borboleta
pára de correr.

Haiku 55

Entre as prostitutas
borboletas fazem a festa
ao final da tarde.

Haiku da semana

Borboleta

Acorda, vem ouvir

Sussurrando no jardim

A brisa da noite.

As minhas pegadas

Somem sem nem deixar traço ...

A brisa na areia.

Haiku 54

Ao passar a brisa
a velhinha se arrepia.
- Canta uma mandinga.

Haiku 53

Fazendo manobras
a brisa corta ligeiro.
Menino skaitista.

Haiku 52

Na manhã de brisa
as folhas se alvoraçam
durante o velório.

Brisa passa livre
apesar dessa parede
da nova cidade

Pode ser a brisa
pode ser aquele cão
que segue no mato

Então era brisa
que balançava o mato
deduziu o menino

E a brisa passa
refrescando minha pele
em dia bem quente

Palavras sopradas
na brisa da madrugada
num papel em branco

Kigô da semana

Brisa

O papel de seda
bem grudado na vareta
pipa vai lá longe

Sem nuvens no céu,
só a criança voando.
Pipa colorida.

Boa pipa com
as varetas de bambu
da casa da vó.

Os dedos cortados
de um moleque pipeiro
sempre dão mais linha.

Os dedos cortados
pelo cortante na linha.
Época de pipa.

Grande rabiola
levanta em alto voo,
pipa colorida

Voando capenga
de rabiola cortada,
pipa insistente

A linha partida
Feito a vida que esgarçou ...
A pipa perdida.

Bailando no céu
Para cá e para lá
As pipas ao vento.

A criança e o pai
Empinam pipa na praça
- Céu nunca visto.

Brincadeira chata:
Linha com cerol cortante,
Corta a minha pipa!

A pipa no céu
Bem acima dos meus olhos
- Sonhos voam alto!

Presa ao fio da luz
Enrola-se com o vento
A pipa amarela!

Na palma das mãos
Algumas jabuticabas
Lembram-me seus olhos!

Ao abrir a janela
Jabuticabas no tronco
- Como meus apegos!

Crianças do bairro
Chutam as jabuticabas
Que rolam no chão!

Haikai 51

No espelho do lago
entre os peixes e marrecos
passeia uma pipa.

Haiku 50

Enroscado aos fios
desespero do menino
da pipa perdida.

Haiku 49

A pipa que passa
diante às nuvens escuras
leva as minhas rugas.

Kigô da semana

Pipa

Haiku 48

Com saco na mão
repartem jabuticabas
os velhos da praça.

Haiku 47

Meu primeiro beijo.
A jabuticaba explode
ao morder bem lento.

Haiku 46

Levando de lanche
saco de jabuticabas
somente em lembranças.

Kigô da semana

Jabuticaba

No sabor tão doce

Das jabuticabas maduras

A infância de novo.

Caídas na grama

Flores de jabuticaba

Ao amanhecer.

Clima mais ameno
vou para casa da tia
e da prima Vera

Acendem mais tarde

as lamparinas nas ruas

Quando vem a Vera

A calçada lota
de frente ao botequim
Chega primavera

Quando há chuvinha
Não usam os regadores
Vem a primavera

O Buda de pedra,
Sentado imóvel no jardim,
Toma banho de sol!

Correndo na rua
Escorre o suor na testa
- seca ao banho de sol

Deitado na grama
Passam as nuvens (nos olhos)
Tomo banho de sol!

Chuviscos à tarde
Tiram o pó das árvores
Para a primavera!

A mulher grávida,
Esperando a primavera,
Poda as folhas secas!

Ao entrar na casa
O ar perfumado no nariz
- Será a primavera?

A primeira flor
Desabrocha nos meus olhos
- Chega a primavera

A mulher da rua
Põe uma flor nos cabelos
Vem a primavera!

Haiku 45

As pernas mais rápidas

apoiadas na bengala.

Primavera chega.

Haiku 44

Nas asas do vento

um frescor alisa a nuca.

Primavera vem.

Haiku 43

Avançar da noite

no balanço dos quadris

primavera chega.

Kigô da semana

Primavera (chegada)

Após tua partida,

A primavera não entrou

Na casa vazia.

Com o manto negro

Inicia a primavera

A pequena monja.

Sobre o galho fino

Da azaléia ressecada

Pousa um colibri.

Pequenos botões

Surgem na velha azaléia

Última florada.

Haiku 42

Avançando às grades
azaléias dão mais cores
à vida que passa?

Haiku 41

Dispostos na estrada
para quem vier primeiro
mudas de azaléia.

Haiku 40

Resiste ao cimento.
Azaléias da avenida
colorem os olhos.

Kigô da semana

azaléia

A cidade ao longe

Fica ainda mais cinzenta

Com o sol de inverno.

Sozinho na rua

Um gato preto boceja

Sob o sol de inverno.

Haiku 39

Sem nenhuma força
custa a nascer sol de inverno.
- O som da muleta.

Haiku 38

Ao surgir o dia
do buraco da lixeira
surge o sol de inverno.

Haiku 37

Manhã sem amigos.
O sol de inverno resiste
entre as nuvens negras.

Kigô da semana

sol de inverno

Haiku 36

Ao cair da noite
na fila de prostitutas
também a coruja.

Haiku 35

Num pasto sem grama
por sobre os torrões de terra
coruja descansa.

Haiku 34

Um par de corujas
ao mesmo tempo na curva
giram os pescoços.

Kigô da semana

Coruja

Assistindo ao enterro

Os olhinhos da coruja

Seguem sem piscar.

Pousada no poste

Uma pequena coruja

Vigia o horizonte.

O cheiro de brócolis
Marca as horas de parar
e lavar as mãos.

Brócolis na mesa.
Sempre fazendo pensar
em comer mais carne

Haiku 33

Ao comer brócolis
um longo apito de trem
que não existe mais.

Haiku 32

Salada de brócolis.
A falta que sinto à mesa
comia com gosto.

Haiku 31

Ao lavar os brócolis
árvores em miniatura
postos na travessa.

Kigô da semana

Brócolis

Olhares cruzados

Ao ver o que tem pro almoço

- Hoje é dia de brócolis...

No final da feira

A mendiga e seu tesouro

- Um maço de brócolis.

A loira se alegra
Com o prato de brócolis
- Poucas calorias.

Brocolis 2

A criança chora
Para não comer brócolis
- esfria o almoço.

Brocolis 1

No centro da mesa
A travessa de brócolis
E os pratos vazios.

Perto do Araçá

Tem promoção de crisântemos

- É Dia dos Pais.

Para o Dia dos Pais

Lenços ou pares de meias

Sem extravagâncias.

Haiku 30

Ao abrir um sorriso
revela falha na frente
no Dia dos Pais.

Haiku 29

No Dia dos Pais
o espaço vazio na mesa
quem ocupará?

Haiku 28

No Dia dos Pais
recolhe um gato da rua
e envolve-o nos braços.

Kigô da semana

Dia dos pais

O banho de Sol
estala as estruturas
de um prédio velho.

Lírio do jardim
mais uma vez começa
seu banho de Sol.

Meu banho de Sol
de poucas horas na cama
terminou por hoje.

Gato preguiçoso

se arrasta pela casa

pro banho de sol.

No banho de sol
Juntos no jardim do asilo
Gatos e velhinhos.

Sob o Minhocão
O mendigo busca uma fresta
Pro banho de sol.

Para o velho bêbado

Só restou como agasalho

O banho de sol.

Haiku 27

No banho de sol
até as olheiras se foram.
Leito de hospital!

Haiku 26

Meus cabelos brancos.
Ao tomar banho de sol
o tempo não passa.

Haiku 25

Ao raiar do dia
em meio ao banho de sol
os pombos doentes.

Kigô da semana

Banho de sol

Haiku 24

O som da carroça
vai cortando o prado seco
e distante morre.

Haiku 23

Ao sugar o lámen
nada pensa o lavrador.
Prado seco dorme.

Haiku 22

Pelo prado seco
nenhum farfalhar das folhas.
Os meus olhos secos.

Kigô da semana

Prado seco

Lá no prado seco
Um homem todo curvado
Carpe o horizonte.

O capim sem vida
Balança ao sabor do vento
No prado seco.

O céu azulado
Recobre a terra rachada
Do prado seco.

Chão azulejado.
Com minhas meias de lã
Não tem importância.

As meias de lã
ficam muito mais bonitas
Vestidas nos pés.

Que dia difícil!
Não lembro onde deixei
As meias de lã.

Haiku 21

As meias de lã
colocadas a secar
correm com o vento.

Haiku 20

Quando a tarde avança
as velhas meias de lã
retornam aos pés.

Haiku 19

As meias de lã
após a partida dela
aquecem de novo.

Kigô da semana

Meias de lã

Nas noites de insônia
Meias de lã não aquecem
A jovem viúva.

Largadas no chão
Esquecidas sob a cama
As meias de lã.

Chuva de inverno
Infiltração na parede
Causam grandes bolhas.

Dois guarda-chuvas
Pendurados na sacada
- Chuva de inverno.

Não funciona bem
Quando chuve no inverno.
Roupa no varal.

Deixa o teclado
com letras embaralhadas.
Chuva de inverno.

O saco de lixo
Cobrindo bem a cabeça.
Chuva de inverno.

Chuva de inverno.
Esquenta o chocolate
de gosto amargo.

Haiku 18

Com forças nas pernas
empurra ladeira acima.
A chuva de inverno.

Haiku 17

Postos a secar
meus sapatos baratinhos?
A chuva de inverno.

Haiku 16

A chuva de inverno.
Quem chega sem anunciar
de manhã bem cedo?

Kigô da semana

Chuva de inverno

Pingando no sala
A lenta chuva de inverno
Vem me visitar.

A chuva de inverno
Levou embora as cores
Das roupas do varal.

Balança lá fora
ipê roxo bem alegre.
Escritório chato.

Era ipê roxo.
Mas agora só restou
Ipê transparente.

Ipê roxo tinge

a calçada do vizinho

sempre quando venta.

Pousado tranquilo
no galho do ipê roxo.
Já entardecendo.

Vejo ipê roxo
No fim dessa estrada
Chegamos em casa!

As gotas da chuva
caindo do ipê roxo
Escorrem no rosto

Haiku 15

Por cima das flores
do ipê roxo esmigalhado
homem de muletas.

Haiku 14

A casa em ruínas.
A florada do ipê roxo
em minhas lembranças.

Ah, velho ipê roxo ...
Será que você se lembra
De quem te plantou?

Mais um fim de tarde ...
Galhos secos do ipê roxo
Cutucam o céu.

Chuva de inverno
molhando flor solitária.
Traz ela pra dentro!

Chuva de inverno
escondendo o gato preto
lá dentro da loja.

冬雨だからねこが店にいますよ。

Andando pelo parque
okinawazakura
É a primeira florada

公園に沖縄桜が始めて。

Chuva de inverno
embaça o vidro do carro
quando estou dentro.

Haiku 13

Onde quer que veja
para cima para baixo
flores de ipê roxo.

Haiku 12

Ao limpar o túmulo
as pétalas de ipê roxo.
- Mãos em oração.

Haiku 11

Num leve balanço
ipê roxo pelo chão.
- Paro a caminhada.

Haiku 10

Em meus modos rudes
por cima dos ipês roxos
minha sombra passa.

Kigô da semana

ipê-roxo

Haiku 9

Nesta noite fria
como consolar a dor
de meu pé doente?

Haiku 8

O vento gelado
não consegue arrepiar
o Buda do altar!

Haiku 7

A sombra da noite
por uma porta entreaberta
traz consigo o inverno.

Haiku 6

A lua de inverno
por sobre as casas dos pobres
tem algum encanto?

Haiku 5

Em noite gelada
aliso o pelo do gato
enquanto adormeço!

Haiku 4

Por onde andará
o gorro da namorada
que há muito se foi.

Haiku 3

As meias de lã
lá do fundo da gaveta
ainda me aquecem.

Haiku 2

Encolhido a um canto
espera o inverno passar.
- Casa de repouso.

Haiku 1

Nesta manhã fria
as marteladas contínuas
na casa vizinha.

Mesmo manhã fria,
o bebê dá um sorriso.
A tarde esquenta.

Yokosso!

Sejam bem vindos ao Projeto Bloco de Haikai.

Um ciberespaço haikaístico cooperativo, coordenado pelo poeta monge, ou monge poeta, Francisco Handa.